VOCÊ É INDÍGENA?
Lembro da primeira
vez que me perguntaram isso, eu tinha oitos anos, estava na escola brincando e
acabei cortando meu joelho. Encontrei próxima a mim uma erva que servia para
cicatrização, lavei e coloquei no pequeno ferimento.
Uma
coleguinha da mesma idade me olhava assustada e perguntou curiosa: “você é
índia? Como sabe que essa planta serve para isso?” Indagou-me. Eu falei que
minha avó conhecia as plantas, sempre fazia remédio para as pessoas, gostava de
cuidar das pessoas e também rezava as pessoas para elas não ficarem doentes.
Naquela
época eu não entendia muito bem porque as pessoas sempre Naquela
época eu não entendia muito bem porque as pessoas sempre ficavam surpresas com
essa informação, de ser indígena, mestiça ou não. Eu me perguntava por que
havia algo diferente no meu mundo que de alguma forma não parecia ser o mesmo
mundo dessas pessoas. Porque ficavam tão surpresas? Era sempre motivo de alguma
brincadeira ou comoção geral. Vivi grande parte da minha infância e
pré-adolescência camuflada na multidão da cidade, mas mesmo assim às vezes
surgia essa mesma pergunta: “você é indígena?”, e outras como: “Você é mestiça?
Alguém é índio na sua família?”.
Na
escola me ensinavam como eram os índios, o que comiam, como viviam e todas
essas coisas. Havia sempre alguma piada relacionada à nudez ou aos nossos
rituais sagrados. Quando falavam sobre pajelança, parecia tão distante da
realidade, sempre algo muito afastado do mundo deles e para mim sempre algo
muito próximo, eu acabava corrigindo alguns professores e nesse momento
percebiam minha identidade.
Pensando
nisso que resolvi escrever esse texto, afinal o que é ser indígena?
Para
o não índio é totalmente diferente, a imagem estereotipada ainda prevalece em
muitas mentes, como desconstruir isso? Somos motivo de encanto, fascínio e
medo. Caminhamos lado a lado nas ruas da cidade e ainda assim somos
desconhecidos por essa sociedade. Fazemos parte do mesmo país embora tenhamos
diferentes culturas, estamos em todos os lugares, em comunidades ou cidades,
carregando no sangue o canto da nossa nação. Não é possível compreender o que é
ser indígena, olhando no museu nossos objetos sagrados, nossas fotos, nossas
roupas, grafismos, instrumentos, cerâmica, artesanato ou buscando uma pureza
racial dos livros de historia. É preciso vivenciar.
Nas
salas de aula ao professor é dado esse desafio, nossa educação é através do
exemplo, da vivência. Assim educamos e somos educados em nosso dia a dia. É
impossível para os alunos compreender o valor de uma cultura sem vivência-lá. O
aluno deve primeiramente compreender que ela não está afastada geograficamente,
que ela não vive apenas em um lugar e que ela se transforma, não é imutável e
sim viva. Ela não é uma cultura, mais muitas culturas e que não somos um povo,
mais muitos povos.
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